09/05/2023 às 09h17min - Atualizada em 09/05/2023 às 09h17min

Audiência no Senado cobra justiça para vítimas de afundamento do solo em Maceió

Foto: Roque de Sá/Agência Senado

A audiência pública da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE), nesta segunda-feira (08), foi marcada por duras críticas à Braskem, que não estaria compensando adequadamente as vítimas da tragédia dos bairros afetados pela mineração.

Os participantes da audiência criticaram os baixos valores de indenização oferecidos pela empresa às famílias afetadas, apontaram risco de exploração imobiliária dos terrenos desocupados e transferidos à Braskem e atacaram os critérios de transparência social e ambiental da petroquímica numa fase de possível reorganização acionária da empresa.

 

‘Cavalo de Troia’

Na audiência, Renan Calheiros (MDB) destacou as proporções da tragédia humana e do desastre ambiental, que considera inequivocamente ligados à atividade da Braskem, e afirmou que o problema demanda uma discussão em nível nacional, por afetar a imagem do Brasil no exterior. Ele classificou a mineração de sal-gema como um “cavalo de Troia” para Maceió e cobrou das partes envolvidas o compromisso de pagamento justo pelo prejuízo causado pela Braskem, em bases satisfatórias para as vítimas e o estado.

— O caso ganha gravidade e magnitude em razão das negociações, algumas sub-reptícias, para a transferência total ou parcial das ações da empresa. Tratativas públicas ou escamoteadas não irão prosperar até que os prejuízos causados sejam honrados.

O senador Astronauta Marcos Pontes (PL-SP) citou outros acidentes, como os derramamentos de petróleo no litoral e os rompimentos de barragens em Mariana e Brumadinho, e cobrou um trabalho sério para prevenção e mitigação de riscos em atividades econômicas.

— Os desastres acontecem e depois a gente chora as pessoas e os bens que foram perdidos. A melhor solução é a prevenção, e que a reparação seja feita de forma correta.

O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) cumprimentou Renan por sua “obstinação” no enfrentamento do caso Braskem, que considera uma causa do povo brasileiro e do Senado.

Reconciliação’

Presente na reunião, o governador de Alagoas, Paulo Dantas, também considerou inconcebível tratar da venda de ações da Braskem sem incluir na pauta a indenização às vítimas. Ele pediu a ajuda do Senado para a “reconciliação da empresa com a sociedade e suas instituições”.

— Não podemos desperdiçar nem um centavo. Muito além do dano emergente, que é o prejuízo em si, há que contabilizar os lucros cessantes, que são os ganhos que o estado de Alagoas ficou impedido de desfrutar em razão da lamentável ocorrência.

O coordenador do Núcleo de Proteção Coletiva da Defensoria Pública de Alagoas, Ricardo Antunes Melro, disse que o povo do estado tem sido maltratado e chantageado pela Braskem nos acordos para pagamento de danos materiais e morais, violando a Constituição e o ordenamento jurídico. Melro contrastou os baixos valores das indenizações pagas pela Braskem com a distribuição de lucros de R$ 7,1 bilhões no mesmo período. Ele também manifestou a possibilidade de a empresa conseguir lucros imobiliários construindo em áreas devastadas que possam vir a ser consideradas habitáveis.

— A população está aceitando [indenizações reduzidas] em massa não porque entende que é justo, mas porque foi colocada por dois anos em situação de penúria.

O deputado federal Rafael Brito (MDB-AL) salientou que sua família também foi vítima da tragédia da Braskem, e que a indenização consiste praticamente em um contrato de compra e venda da área afetada.

— Não há perda financeira para quem causou o crime. Os imóveis que foram indenizados não podem ser tratados como ativos.

Por sua vez, o deputado estadual de Alagoas Alexandre Ayres (MDB) espera que a legislação seja modificada para impedir o “uso mercadológico” das áreas devastadas. O parlamentar sublinhou o atual movimento especulativo em torno das ações da Braskem como um momento oportuno para reparações ao estado e ao município e para revisão das indenizações.

Segurança

O professor e mestre em geotecnia Abel Galindo Marques fez uma exposição sobre a dinâmica das minas de sal-gema em Maceió, mostrando como os poços foram feitos gradualmente com maior diâmetro e menor afastamento — situação que ele atribuiu à “ganância” da Braskem.

— Mais de 70% dessas minas estão com fator de segurança muito abaixo do mínimo necessário. Por isso é que desabaram.

Presidente da Associação dos Empreendedores no Bairro do Pinheiro (uma das áreas afetadas), Alexandre de Moraes Sampaio afirmou que a Braskem engana a Bolsa de Valores, as vítimas e o Estado brasileiro — na condição de acionista da Petrobras, que pode incorporar a Braskem — com o uso de termos enganosos sobre sua responsabilidade ambiental. Segundo as estatísticas que apresentou, quase 50 mil imóveis no entorno da área de risco perderam o direito à cobertura de seguro e, portanto, não podem ser financiados.

— Há um esforço deliberado e ilegal de mascarar o tamanho da dívida social e econômica da Braskem.

Indenizações ‘irrisórias’

O líder comunitário Antônio Domingos dos Santos, representante de bairros atingidos, repercutiu a apreensão dos moradores com a possibilidade de novas tragédias e definiu que as indenizações são “irrisórias” e impostas “goela abaixo” das comunidades.

Maurício Sarmento da Silva, representando o Movimento Único das Vítimas da Braskem (MUVB), disse que o crime ambiental destruiu comunidades tradicionais vivas e ricas em história que a Braskem insiste em eliminar. Já Hugo Wanderley, presidente da Associação dos Municípios Alagoanos, ressaltou os efeitos adversos da tragédia de Maceió sobre todo o estado.

A socióloga Camila Dellagnese Prates denunciou a falta de transparência dos dados apresentados pela Braskem e a tentativa da empresa de classificar o desastre como “dano geológico”. O professor José Elias Fragoso Pereira contestou o “castelo de lendas” em torno da importância econômica da Braskem para Alagoas.

Entre outros participantes do debate, estão Isadora Padilha de Holanda Cavalcanti, presidente do Instituto para o Desenvolvimento das Alagoas; o sociólogo Edson José de Gouveia Bezerra; e Tereza Nelma, secretária nacional de Aquicultura.

*Com Agência Senado


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